terça-feira, 16 de novembro de 2010

O Haiti é logo ali


Eliseu é um médico brasileiro, professor universitário com doutorado em neurocirurgia. Recentemente esteve em Santo Domingo, prestando consultoria às autoridades de saúde locais. Ao final de um dia de trabalho, perguntou a um médico dominicano onde poderia comer o melhor fruto do mar da cidade. O indicado foi um restaurante metido a chique no malecón, quase em frente ao Hilton, onde o Dr. Eliseu estava hospedado.

Por volta das 21h chegou ao restaurante, e como ninguém viesse recebê-lo à porta, escolheu ele mesmo uma mesa com vista para o mar. O movimento estava fraco, mas os garçons mal o olhavam. E nenhum se dignava a atendê-lo. Alguns minutos se passaram e, incomodado, tentou chamar o maitre. Permaneceu solenemente ignorado. Levantou-se e foi comer uma pizza em outro lugar.

No dia seguinte, comentou com seu colega médico o ocorrido. O dominicano se mostrou surpreso, e convidou Eliseu a retornar naquela mesma noite ao restaurante, desta vez em sua companhia. Ao chegarem à casa, o colega de Eliseu foi logo perguntar ao gerente por que eles não haviam atendido o brasileiro. A resposta foi tão singela quanto reveladora: “Desculpe, Doutor, pensamos que era um haitiano. Seu amigo é negro como eles”.

Essa historinha sem graça vivida por Eliseu é emblemática de um drama social que vem se agravando na República Dominicana. Com a inviabilização do Haiti como país, mais e mais haitianos têm procurado refúgio na nação vizinha. Aqueles que conseguem ultrapassar as fronteiras fortemente vigiadas, e vagar durante semanas pela floresta, passam a viver em guetos na periferia de Santo Domingo. Sem trabalho, sem cidadania, sem direitos mínimos.

Fogem dos terremotos, furacões, doenças e outras catástrofes que assolam seu país para enfrentar o preconceito e a marginalização na república vizinha. O Haiti é logo ali, mas circulam pelas ruas como se tivessem vindo de outro planeta. Ou melhor, do inferno.

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Amigo, esta é uma triste realidade mundo afora que ainda está longe de ser alterada...mas será!
    Estou aqui: seguindo-o e lendo-o. abraços

    jj

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